Espera, cansaço, insegurança, falta de respeito com os estudantes. A situação do transporte escolar no interior do Ceará demonstra o descaso das autoridades com crianças e jovens que, sem outra opção para chegarem à escola, são obrigadas a se arriscarem em caminhões pau de arara. Mesmo assim, eles continuam sorrindo, brincando e sonhando com um futuro melhor.
No destaque, alunos de Acopiara em "paus-de-arara".
Fazer o quê?
A falta de uma efetiva política voltada para o transporte escolar influencia o cotidiano de tantas crianças cearenses que, diariamente, se arriscam em veículos inadequados e estradas perigosas que tornam o acesso à educação um rally sem prêmios. Saem de madrugada para chegar na escola quando o sol ainda aponta lá na linha do horizonte. Chegam já cansadas e empoeiradas, pois a maioria mora em distritos distantes e de difícil acesso.
Vivendo e aprendendo
Embarquei no pau de arara e fui até a zona rural. No percurso, o desânimo de alguns dava lugar aos discursos politizados ou às brincadeiras de outros. Me chamou atenção o fato de não haver lugar nenhum para se segurar, a não ser uns nos outros. Cada centímetro de madeira era muito disputado. Só o teto do pau de arara escapava das mãos, pois era de folha de zinco e quente como uma brasa. Para alguns chega a hora de descer. Para outros, no entanto, esse ainda não é o fim do percurso, já que têm de caminhar outros tantos quilômetros até chegar em casa.
De volta pra casa
Após o término das aulas, começa outro exercício de paciência (ou de fé): o retorno à casa. Coloque aí, no mínimo, mais uma hora e meia de espera, tempo mais que suficiente para colocar a conversa em dia, dar uma lida na tarefa de casa ou repassar a lição que causou curiosidade e mais vontade de aprender. Dá para conferir algo no celular, mesmo que a operadora muitas vezes não ajude. Dividir algo com o amigo ou ficar ali sentado no canto, sozinho, pensando na vida e esperando a hora de voltar para casa. Lá também está sentada a fome, uma velha conhecida. O sol também está ali de um jeito que ninguém aguenta. O horário é ingrato para todos, inclusive para fotografar, mas eu não posso reclamar. Quem tem o direito são aquelas crianças que buscam um futuro melhor.
Cadê meu filho?
É hora de abrir o guarda-sol e enfeitar a paisagem com a esperança e a inocência de ser criança. Caminham com o olhar sempre adiante e sem desistir. Nenhuma mãe, esteja ela onde estiver, merece receber a notícia de que seu filho hoje não vai almoçar com ela, pois a fatalidade de um acidente, por um transporte inseguro e perigoso, deixou mais uma criança sem futuro. Marinete hoje guarda as lembranças e as saudades que não cabem no retrato.
Edimar Soares é repórter-fotográfico do O POVO, estudou fotografia no SENAC-GO, participou de exposições coletivas e individuais, fez cursos e workshops em algumas áreas da fotografia. E o mais importante: continua fotografando com prazer.
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